sexta-feira, 11 de junho de 2010

Um argumento...

Madalena, uma mulher na casa dos quarenta, vem enfrentando alguns problemas desde seu divórcio. Os filhos já saíram de casa e, pela primeira vez em muitos anos, Madalena se encontra assustadoramente sozinha. Ela dá aula em uma faculdade em São Paulo, chamada ESPM, onde ensina História da Arte. Hoje, sentada em sua sala de estar, tomando café antes do primeiro dia do ano letivo na faculdade, ela vê uma borboleta em sua mesa. Um pensamento passa pela mente da professora: "Quem dera...um pulo na janela e eu já estava no céu.".

Já na faculdade, ela entra na sala de aula onde a turma nova já a aguarda. O ambiente é esquentado pelos ânimos jovens. Maria, uma estudante que lhe chama atenção, está sentada em um canto da sala pensativa. Um flash de problemas passam pela cabeça de Maria. Enquanto isso, Madalena, depois de alguns segundos fitando a aluna distraída, se instala e começa a aula. Ao toque do sinal, a professora encara a aluna e fala: "Muita dispersão, espero não ter que chamar sua atenção na próxima aula.". Maria se desculpa com um olhar terno. Ao sair da sala, Maria abraça dois amigos que a esperam com muita empolgação, os problemas parecem sumir com facilidade na idade dela. Nesse instante, uma pontada de inveja fulminante domina Madalena.

No refeitório dos professores da ESPM, Madalena se senta sozinha em uma das mesas para almoçar. É um lugar amplo, cercado por uma sacada enorme onde os professores fumantes aproveitam sua folga. Madalena se distrai, pensando na situação que ocorrera de manhã e em como sua vida se tornou o que ela sempre temia na juventude: uma rotina de idosa. Por um momento, a borboleta passa pela mesa de Madalena, assim como ocorrera antes. Nesse instante, Madalena olha para a sacada e se envolve em uma visão turva. Nesta visão, ela vê a linda Maria em uma camisola branca, toda rendada. Ela só escuta Maria dizendo: "Como você aguentou? Não sinto que vou aguentar... o que te segurou por tanto tempo? Nada me segura aqui, a não ser...". Sem terminar a frase, Maria se joga.

O transe é interrompido por um professor que se junta a ela para comer. Madalena se esquece do que parece ser só uma alucinação boba e segue com sua vida. Ao fim do seu expediente, passando pela porta da faculdade, a professora vê Maria do lado de fora, embaixo da chuva que cai com força.

Maria e um rapaz se divertem enquanto a chuva os molha. A paixão infato-juvenil dos dois é cativante, por mais que ela talvez dure menos que um jantar à luz de velas. Maria dança feliz na chuva com seu companheiro e vê Madalena dentro da faculdade, seca e segura. Um aceno simpático derrete a inveja que passa pela mente de Madalena. Talvez, no lugar desta, se instale um carinho grande pela aluna que acabara de conhecer. Impressionante como um dia pode fazer a diferença.

A semana segue tranquila para ambas, excluindo uma ou outra vez que seus caminhos se cruzassem. Em sua segunda aula para a turma de Maria, Madalena aparenta estar nervosa. Seus livros caem, ela se atrapalha com a apresentação de power point, parece que te algo a incomodando. A aula parece correr bem, até que a docente enxerga Maria totalmente distraída escrevendo em um caderno. Madalena, já um pouco atordoada, toma uma pose rigorosa, pega o caderno de Maria e a exclui da sala. Maria está diferente agora. Toda aquela alegria da menina que tomava chuva com seu amor parecia ter ido embora. Madalena não se importou, aliás, talvez nem tenha visto.

Ao fim da aula, a professora solta um suspiro forte e se senta em sua cadeira. Alguma coisa a agoniza e ela não sabe o que é. O caderno de Maria está em cima da mesa à sua frente. Madalena o pega para ler o que Maria escrevera. Eram poucas palavras, muito simples até, mas que fizeram Madalena se levantar, deixar o caderno cair e sair correndo, na procura pela aluna. No caderno caído só se lia: "E nada me segura aqui, a não ser uma visão bonita no espelho, com um vazio no coração."

Está chovendo, Madalena sai da faculdade e vê Maria passando pela rua. Ela corre até a aluna e grita seu nome. Maria se vira, chorando. Madalena lhe dá um abraço forte, que é retribuído. O abraço que acaba e as duas se fitam, testa com testa...

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